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That blue sky feeling: um mangá LGBTQ+ bem-intencionado, mas problemático

Foto do escritor: Andrea SantosAndrea Santos

That blue sky feeling (roteiro de Okura, arte de Coma Hashii, publicado pela editora Mythos em três volumes) é um mangá que narra os encontros e desencontros de um grupo de amigos no ensino médio. Tudo começa quando Dai Noshiro, vindo de outra cidade, chega à sua nova escola e percebe que o colega Kou Sanada vive isolado da turma. Noshiro rapidamente faz amigos, mas não se conforma com a distância de Sanada, e quer que ele também se integre à classe. Ao procurar saber os motivos daquela situação, ele descobre boatos de que Sanada é gay, e não sabe bem como agir quando a informação é confirmada. Assim, um turbilhão de sentimentos conflituosos toma conta do novato, e ele precisa aprender a lidar com seus próprios preconceitos e com o julgamento alheio devido à proximidade com alguém tão diferente. Para complicar mais as coisas, temos Ayumi, uma amiga de Sanada que é apaixonada por ele. 



Noshiro é, ao mesmo tempo, simpático, bem-intencionado e um tremendo sem noção. Claro, é preciso considerar as diferenças culturais: no Japão a homossexualidade ainda é um tabu considerável, e além disso, a adolescência é mesmo uma fase complicada, na qual a pessoa ainda está aprendendo a entender o mundo e as relações humanas. Mesmo assim, Noshiro é retratado praticamente como um analfabeto emocional: alguém que nunca se apaixonou, não faz ideia de como é gostar de alguém, não entende direito o que é ser gay e as implicações disso… Não haveria problemas nesse desconhecimento caso ele se esforçasse para respeitar o colega e deixá-lo se abrir no tempo dele, mas Noshiro faz o contrário. Na ânsia de agradar e mostrar que não tem preconceito, ele gruda em Sanada e basicamente encurrala o garoto, fazendo-o se fechar mais por algum tempo. 



Mas personagens meio irritantes não são um obstáculo quando a obra é boa e consegue desenvolvê-los bem. O problema de TBSF, porém, reside justamente nesse desenvolvimento: o primeiro volume gira em torno das descobertas e confusões de Noshiro, não saindo muito do lugar. Era de se esperar que os dois volumes seguintes seguissem a história com mais aprofundamento das relações entre os personagens, mostrando uma evolução perceptível, mas não é isso que acontece. A história segue em círculos, girando em torno das mesmas questões. Até o final, fica a impressão de que Noshiro pouco cresceu, pois ele continua tendo atitudes questionáveis ao tentar agradar os outros. Apenas nas últimas páginas ele parece chegar a algumas conclusões importantes, que já eram óbvias há muito tempo para quem está lendo e também para outros personagens. Aliás, esse é outro ponto em que a obra peca: o excesso de personagens acaba tomando espaço e atrapalhando o desenvolvimento dos protagonistas, envolvendo-os em situações que geram muito ruído e tiram o foco do que importa. 



Mais uma crítica a ser feita é sobre a relação entre Sanada, um adolescente de seus 16 anos, e Hide, um homem 10 anos mais velho, que é apresentado como ex-namorado do garoto. Como sempre, é necessário ponderar as diferenças culturais antes de condenar esse tipo de coisa, mas mesmo assim, tal diferença de idade nesse período da vida é um abismo, e em nenhum momento o ex-relacionamento é problematizado. Pelo contrário, é abordado com leveza e humor, e Hide se torna uma peça importante no mangá, assumindo o papel de conselheiro e amigo dos adolescentes, o que é, no mínimo, muito suspeito. 





O segmento LGBTQ+ vem ganhando força na nona arte nos últimos anos, e temos visto diversas publicações do gênero chegando às lojas, especialmente mangás. Isso é ótimo e muito necessário, mas também é natural que algumas tenham mais qualidade que outras. TBSF é uma dessas obras que acabam não se destacando tanto, devido aos problemas de desenvolvimento e à falta de carisma de alguns personagens (e talvez até de química entre eles). Para quem já leu mangás como Ao no flag, Shimanami tasogare e Nossas cores, todos já disponíveis por aqui, e quer mais histórias do gênero, pode valer a conferida, mas tenha em mente que encontrará uma obra que fica apenas na média ou um pouco abaixo dela, quando comparada a outras mais interessantes.


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4 Comments


alinefnoronha
Jan 26

Ótima resenha! Era um mangá que eu tinha vontade de ler, mas perdi um pouco o interesse quando soube desse relacionamento (ex) com essa diferença de idade.

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Andrea Santos
Andrea Santos
Jan 26
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Se é um fator que te incomoda ou até mesmo um gatilho, então é bom ir com cuidado. Não é o foco da obra, mas tá lá e tem algum destaque.

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Monique Mazzoli
Monique Mazzoli
Jan 25

Muito interessante, Déa. Mesmo do. As problemáticas que vc citou, a história parece legal para conhecer.

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Andrea Santos
Andrea Santos
Jan 26
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Sim, é uma história simpática de amadurecimento. Na minha opinião, tem outras melhores, mas ainda assim pode valer a pena pra quem gosta.

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